Como Conheci Antonio Fagundes - Texto de Simone Bastos

 

Aos quinze anos surgiu uma escoliose muito forte na minha coluna e enquanto não terminou a fase de crescimento, até os dezoito anos, tive que usar um colete, desses que vem da base da coluna até o pescoço, chama-se Colete Milwaukee.

Com dezessete anos entrei em Comunicação Visual na Universidade Mackenzie, e no primeiro ano eu ainda usava colete.

Como vinha do estágio e era muito incomodo pegar ônibus, descia na Avenida São João e ia a pé até a Faculdade. Sempre muito carregada com canudo com projetos, régua T, pasta A3, enfim, eu pendurava o que dava no pescoço e ia em frente, todo mundo me olhando.

Na subida da Rua Maria Antonia reparei em um homem que do carro sorria muito pra mim, quando olhei direito vi que era Antonio Fagundes. Sempre no mesmo horário a gente se encontrava porque era o caminho dele para o teatro, um dia ele buzinou me chamou e disse:

- Desculpe, mas adoro ver você com todas as coisas penduradas, mostra que você leva muito bem sua atual condição.

Eu agradeci e por muito tempo a gente se via, ele buzinava e ia embora.Eu me achava o máximo, kkkkkk.

Alguns anos depois o Antonio Fagundes foi fazer um comercial da Erundina na produtora que eu trabalhava e na época era assistente de direção. Cheguei com a equipe super cedo e montamos tudo no estúdio, tava tudo pronto quando o diretor chegou de mau humor. Entrou no estúdio e tropeçou no cabo de câmera, ficou nervoso porque os meninos não tinham montado do jeito que ele tinha falado, puxou o cabo com força e com isso arrancou os terminais de saída da câmera. Era Betacam na época. O Fagundes ia chegar a qualquer momento e se chegasse e não estivesse pronta a luz ou qualquer outra coisa ele virava as costas e ia embora. Ele era assim.

Aí tive a maior discussão com o diretor.

- AHHHHHH Que lindo! Agente tá aqui desde as seis horas da manhã, você chega de mau humor, arrebenta a câmera e agora não temos outra pra gravar. Agora quero ver!

- Você se vira Simone vai lá e fala com o Fagundes.

Eu falei:

- Eeeeeeu? Não vou falar!

- Inventa uma desculpa

- Eu não vou inventar nada, vou falar a verdade.

Quando acabou a discussão e saí do estúdio e dei de cara com o Fagundes. É claro que ele não me reconheceu como a menina do colete.

- Oi tudo bem Fagundes? Sou a Simone, assistente de direção, vou participar dessa gravação e aconteceu o seguinte: O diretor chegou de mau humor, tropeçou no cabo da câmera ficou nervoso, puxou e arrebentou as saídas da câmera. Então é assim. Vai atrasar, tudo bem? Você quer voltar mais tarde, outra hora? A gente remarca.

Ele olhou bem pra minha cara e disse:

- Tem padaria aqui perto? Vamos tomar um café?

- Vamos!

Fiquei aliviada, o cara ia gravar.

Fomos para uma padaria na Vila Olímpia, perto da produtora. Sentamos em uma mesa e depois de um tempo começa um burburinho que foi aumentando. Revolucionou a Rua Fiandeiras, as pessoas começaram a sair das casas pra ver o Fagundes. Ele falou:

- Ih, acho melhor a gente voltar.

Quando chegamos na produtora ele sugeriu que seria bom experimentar o figurino. Subimos no camarim. Escolhemos algumas roupas e sem nenhuma cerimônia ele simplesmente abaixou as calças para experimentar uma das opções. Ele tava fazendo a novela Vale Tudo, galã, no auge. Imediatamente saí do camarim e fui pra sala ao lado.

- Simone vem aqui! – ele disse sem entender nada.

- Não vou não!

- Simone deixa de ser boba! Vou experimentar a calça! Você precisa aprovar.

- Pode experimentar, faz o que quiser, mas é o seguinte, eu to aqui disfarçando pensando que sou profissional, agora ver você de cueca vinho não vai dar Fagundes, é melhor eu ficar aqui do outro lado.

Claro que ele achou graça e a partir daí ficamos amigos e ele sempre se lembrava dessa história. Depois acabei contando que era a menina estranha do colete, o que serviu pra firmar ainda mais nossa amizade, afinal, coincidências e cueca vinho do galã do momento são meio raras....kkkkkkk.