Durante quatro anos o Banco Bameirindus veiculou mini documentários de três minutos no intervalo do Fantástico, “Gente que Faz”. Uma equipe de jornalistas percorria o Brasil atrás de histórias de pessoas que faziam diferença em sua comunidade, depois de roteirizadas viravam “cases”. Na época foi uma inovação de bastante sucesso.
Feito em vídeo a produtora apostou em diretores e diretores de fotografia vindos do cinema, pessoas que faziam longas e documentários. Isso fez com que o trabalho tivesse uma cara diferente da publicidade da época.
A equipe era reduzida, a luz tinha um “kit” fixo independente das locações, as pessoas envolvidas acumulavam funções dentro do set. Por exemplo, em vídeo normalmente o diretor de fotografia não operava câmera, lá tinha que operar, além de ajudar, junto com o diretor e produtor, na direção de arte. O operador de VT fazia também assistência de câmera e áudio, e por aí vai.
Na época quem coordenava a produção era a Deize Bélgamo, pessoa sensacional que já conhecia de outras produtoras. O “Gente que Faz” tinha profissionais que eram frequentes nas produções, nada mais lógico para criar uma sequencia estética. De vez em quando precisavam de mais pessoas e a Deize sempre me consultava, por causa das condições citadas acima sempre relutei, mas uma vez ela me ligou e disse que o trabalho seria em Monte Pascoal em uma tribo, ai pensei: Quando terei oportunidade de conhecer um lugar desses? Topei.
A partir daí fiz outros, até que o Bameirindus resolveu encerrar o contrato. Esse mesmo formato foi vendido para a Petrobrás com o nome de “Qualidade sem Limites” e a história que conto hoje começa ai.
Fomos para Itapipoca no Ceará em uma vila de pescadores. Lá eles tinham que viajar dois dias até encontrarem condições para a pesca, isso estava aumentando a mortalidade.
A Petrobrás tinha um programa ecológico de criação de arrecifes artificiais, aproveitavam sobras de aço e pneus para jogarem no mar e assim impulsionar a biodiversidade, essa “amarração” provê abrigo contra predadores, sítios reprodutivos, micro-habitats adequados e maior disponibilidade de alimento para as espécies atraindo peixes. Nossa missão era, além de contar essa história, registrar em um rebocador um arrecife artificial sendo jogado no mar, isso aconteceria a mais ou menos quatro horas da costa. Com o tempo, os pescadores viajariam somente esse tempo para conseguir pescar.
A equipe era a Luiza produtora, o Rogério Costa maquinista e amigo, Vagner eletricista, Sinval operador de VT, eu e o diretor, que é um capítulo a parte. O diretor é culto, extremamente educado, falava baixo, algumas vezes mal humorado, um cara do bem que chamávamos de Lorde, só entre a gente.
No dia da gravação acordamos cedo, colocamos os equipamentos em um barquinho, depois de um tempo no mar passamos para um flexboat que o diretor quase caiu e foi salvo pelo Rogério, daí para uma escuna que nos levaria até o rebocador, sempre acompanhados dos pescadores.
O trajeto na escuna foi maior, o rebocador estava em alto mar. O mar começou a ficar agitado, a escuna balançando muito, depois de algum tempo a equipe começou a passar mal, lógico que na noite anterior encheram até a tampa de cerveja. Passava pelo Vagner e o Rogério, cada um em uma borda e só ouvia os dois vomitando muito e de um jeito escandaloso. Estou ao lado da Luiza e do diretor, quando ele fala:
- Luiza, acho que vou vomitar...
E lá foi a Luiza escorando o diretor até a borda da escuna e só escuto ele vomitar, mas não do jeito do Vagner e do Rogério, era com muita classe, ao invés do:
- HURGHHHHHHHHH! – e tosse e - HURGHHHHHHHHH!
Era:
- Hurgh...ahhhhh.....
Nunca vi ninguém com tanta classe nessa situação.
Não demorou muito e mais um PT, Sinval, só sobrou eu e a Luiza, que acabou virando minha assistente e operadora de VT, precisava rodar algumas cenas do trajeto.
Finalmente chegamos no rebocador, que é muito maior que a escuna e ai veio a notícia de um dos pescadores:
- O mar está agitado demais e não vamos conseguir fazer a “sombra” para subir no rebocador, vamos ter que nadar. – sombra é encostar uma embarcação na outra.
NADAR??? EU NÃO SEI NADAR!!!!
A equipe e diretor passando mal, mas um pouco melhor depois de quase uma over dose de Dramim, começaram a se preparar. Descobri que o Sinval sabia nadar muito mal. Ficamos eu e ele com aquela palavra ecoando no cérebro... NADAR...
Quanto ao equipamento a solução foi içar com corda da escuna até o rebocador. Luiza, Rogério e Vagner foram os primeiros a se jogarem no mar, nadaram até a boia que os pescadores ficavam segurando e foram puxados até o rebocador. O Sinval se jogou mirando a boia errou e os pescadores o levaram até a boia. Eu ia ganhando tempo fumando sentado em canto da escuna batendo os calcanhares de nervoso, até ouvir o diretor atrás de mim:
- Vamos, vamos Fernando.
Não teve jeito, fui para a proa, fiquei olhando a boia, a boia olhando pra mim, a escuna subindo alto e descendo por causa da marola, não sei quanto tempo isso durou até que respirei fundo e me joguei....a partir daí tudo foi em câmera lenta. Me senti saltando em um precipício, acertei o alvo e agarrei a boia, comecei a afundar na água, sensação de metros e metros, comecei a voltar para a superfície que nunca chegava, mas chegou e a vida voltou a vinte e quatro quadros.
Depois o Rogério me contou que entre sabermos que teríamos que pular até eu me jogar eu fumei um maço de cigarro.
O rebocador ainda navegou por mais um tempo mar adentro. A equipe e o diretor foram deitar nas cabines que era em um lugar bem apertado, que o Rogério bateu três vezes em um mesmo batente antes de acertar a cama, enquanto isso eu e a Luiza gravávamos. Depois de um tempo o diretor, mesmo passando mal foi acompanhar. Terminamos e tudo deu certo, mas...tem a volta, teríamos que voltar para a escuna que estava nos esperando no mesmo lugar.
Fiquei eu e o Sinval sentados absolutamente em silencio esperando a hora de nos jogarmos em alto mar, com aquela palavra de novo na cabeça... NADAR!!!
Deus existe, o mar foi ficando calmo e soubemos que daria para fazer a sombra. Quando chegamos corri junto com o Sinval para perto das escadas do rebocador e assim que a escuna encostou quase que me joguei, vai que o mar volta a ficar mexido...
Só sei que virei motivo de risadas da equipe, mas tudo bem porque depois eu ri bastante também.
Nesse trabalho aconteceram mais coisas. Carros atolados na areia, trajeto de helicóptero gravando até o rebocador, que também foi tenso, enfim, coisas que deletei completamente porque certamente o trauma de ter que me jogar em auto mar foi maior e só relembrei agora, depois de conversar com o Rogério e o Sinval.
Aliás, logo teremos novidades, o Podcast do Cinematórias, lá poderão ouvir o relato dos dois.
Demais, saudade disso...estou tentando ver a data, mas com certeza foi das viagens mais louco que fiz, culpa do Fernando....rs😂
ResponderExcluirPra mim, foi a melhor história do blog! ahahahahah
ExcluirVocê não vale Ana....kkkkkk
ExcluirÔ Rogério, culpa minha não, põe na conta daquele mar bravo demais, amigo, obrigado!
ExcluirFico aqui imaginando o Fe de olhos arregalados e fumando como um doido kkkkkkkkk
ResponderExcluirO pior é que foi assim mesmo....kkkkkkk
ExcluirKkkkkkkkk...rindo muuuuuitoooooo.....sensacional...... Agora numa época que estamos vivenciando que tudo está tão difícil, nada como nos deliciarmos com histórias maravilhosas para rirmos a vontade, muito mil, Ana tem razão Fernando hahhahaha....
ResponderExcluirValeu Katia, vc sempre generosa. Muito obrigado!!!
Excluir😉🥰
ExcluirAdorei o causo 💫💫💫
ResponderExcluirMuito obrigado Wagner!!!
ExcluirKkkkkkkkk
ResponderExcluirSituação constrangedora!!
Aprendeu a nadar?....
O pior é que não Márcia, continuo com a boia de patinho....kkkkkkk....muito obrigado!
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