Pelo Facebook
reencontro um moço que era office boy numa produtora que trabalhei uns anos.
Muito engraçado, novinho nem sei se já era maior de idade e eis que de repente
surge o Dema muuuuitos anos depois!
Fez família,
teve filhos e virou empresário. Dono de uma produtora em ANGOLA!!!!! Fiquei
mega orgulhosa de seu progresso.
Me convidou
pra fazer uma mini série, o diretor que ia fazer o projeto voltou ao Brasil e
lá fui eu substituir Pablo Polo.
Confesso que
perdi a noção de quantos meses fiquei lá.
O trabalho
estava só na sinopse e uma historiadora angolana era a roteirista, virou uma
grande amiga pra vida e uma parceira em Angola. Isilda é mega inteligente, culta,
divertidíssima, humor ácido e mulher alpha. Aprendi pra caramba com essa
rainha.
Ela não tinha
meias palavras pra detonar o que tinha de errado com as pessoas em seu país,
mas explicava a origem do mau.
Me arrependi
muito de não ter feito um documentário paralelo para mim das histórias que ouvi
que não tinham nada a ver com o projeto.
Uma delas que
me marcou muito foi a de um ator que no intervalo do teste de VT me contou.
Todos têm
histórias da guerra, não importa se era criança ou não na época. A guerra civil
começou em 1975 logo após Angola ter se tornado independente de Portugal e foi
até 2002. Uma luta de poder entre dois grupos o socialista MPLA e o antissocialista
UNITA pra encurtar a história.
Nesse caso o
grupo do Savimbi que era da UNITA sequestrou a irmã dele que ainda era uma
criança e a guerra durou aaaaanooooos, ele virou soldado da MPLA e estava numa
batalha quando uma moça aponta a arma pra ele e eles se reconhecem. Era a irmã
que cresceu e virou soldado da guerrilha. Não consigo imaginar o choque dos
dois.
Nesse link
tem mais detalhes dessa prática de sequestro de crianças: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0905200107.htm
Masssss quem
sou eu pra falar da história de outro país sem ouvir o outro lado?
Então vou
contar somente alguns momentos que vivi lá até chegar ao “O mundo é uma Kombi”.
Nossa equipe
dividia uma casa. No início era só eu, o Dirceu diretor de produção e a Rebeca
minha assistente. A equipe era gigante e toda do Brasil então conforme o
job ia avançando chegava o profissional necessário para aquela fase.
A casa era
novinha fomos os primeiros moradores. Então a produção só ia saber dos
problemas conforme fossem aparecendo. Tinha três quartos e dois banheiros no
andar superior, um no quarto das “meninas “e outro, sem chave, no
corredor que atendia os outros dois quartos. Quase todos os dias faltava luz e
consequentemente faltava água porque a caixa d’agua era subterrânea e se não
tinha luz o motor não funcionava pra puxar a água, nunca perguntei por que as
caixas não eram no telhado como aqui. Todas as casas têm um gerador e o dessa
casa estava quebrado então necas de tomar banho e fazer comida, várias noites
ficamos sentados no chão da varanda no escuro conversando porque não tinha o
que fazer até dar sono. Não sei se é assim em toda Luanda ou somente no nosso
bairro que era tipo Alphaville, bem afastado do centro, mas foi um perrengue.
Nos dois primeiros dias ficamos sem tomar banho, aí quando percebemos que ia
demorar pra resolver o problema com o gerador a solução foi ir à casa dos
outros brasileiros da produtora usar o banheiro e tomar banho, maior vergonha
porque a gente não conhecia as pessoas, masssssssssss não tinha como fugir
disso.
Depois que o
gerador foi consertado, até nos acostumarmos com não lembro o que tinha que
fazer pra encher a caixa d’agua, muitas vezes ficávamos sem água e tinha que
chamar a Sabesp de lá pra encher a caixa e a gente vivia esquecendo esse sei lá
o quê, então faltava água direto.
Lá tava eu um
dia de muitos com o caminhão pipa enchendo a caixa e claro que batendo o maior
papão com o motorista quando perguntei de onde vinha a água, tipo a Sabesp fica
aqui ou no centro de Luanda? e a resposta foi:
- Do rio
Kwanza
- Como
assim?!?!
- A gente
encosta o caminhão e puxa a água do rio.
O caminhão
não era da Sabesp era de uma empresa particular, não tinha tratamento algum.
Eu já tinha
feito 50 anos ou estava próxima de fazer e meu dente do siso resolveu nascer
ali, rasgando a gengiva um pouquinho a cada dia. Sim! QUEEEEM você conhece que
o siso nasceu depois de velha? E em outro país? Eu né! Liguei pra minha irmã
que é dentista e perguntei o que fazer. Mandou bochechar com água oxigenada e escovar
os dentes somente com água mineral. Dá-lhe garrafinha.
No banheiro
das meninas não tinha água quente e lavar o cabelo comprido com água gelada é
um catso e odeeeeio banho frio, então fui tomar banho bem cedinho no banheiro
do corredor. Lembra que falei que não tinha chave?
Escrevi um
bilhete avisando que estava usando o banheiro, mas a porta abria sozinha, coloquei
meu necessaire pra tentar segurar a porta, mas não dava pra confiar então o
banho foi um olho no peixe e o outro no gato. O banheiro era enorme e o
chuveiro era longe da porta não dava pra esticar a perna e segurar a porta
enquanto tomava banho.
Não tinha
box, nem cortina, só um quadrado muradinho com uns 5 dedos de altura e o
chuveiro no centro. Em cima tinha outro quadrado de ferro que era pra colocar a
cortina que não tínhamos, então peguei minha toalha laranja novinha da Tokstok
(faço questão de dizer a origem, vocês vão entender o motivo) e pendurei nesse
ferro como se fosse uma cortina porque se o Dirceu entrasse não me pegava
pelada de cara.
Comecei a
tomar banho, a água quente que eu imaginava não existia, eram 2 torneiras uma
fria e outra gelada.
Do chuveiro vinha
uma cachoeira forte durante 5 segundos
aí parava e ficava fraquiiiinha uns 15 segundos e voltava forte de novo,
assim foi o banho, passava shampoo, ficava fraco, demorava pra espalhar no
cabelo, a porra da água fria, aí vinha a enxurrada , puta susto, o humor indo
pro saco ,meu pé mergulhado numa água estranha que se empoçou naquela
banheirica quadrada, eis que a água começa a ficar com uma coloração laranja
forte e eu pensando que porra é essa? quando vejo, o laranja estava escorrendo
da minha toalha nova pendurada no varão lembra? Como eu estava de costas pra
toalha não percebi que o chuveiro quando ficava forte ia direto pra toalha. Ensopou,
eu comecei a torcer a toalha, o quadradinho entupido, eu com medo de
transbordar aquela merda, o meu chinelo já estava quase boiando no banheiro e se
transbordasse aquela água laranja, ia pro corredor, pro quarto do Dirceu,
imagina o pânico da criatura aqui!
A porra do
varão com a minha toalha e minha camisola caiu naquele rio, preciso contar o
que o papagaio aqui ficou com quinhentas coisas na mão? Água e tinta pingando
da toalha, da camisola. CAOS.
Quase dei no
Dirceu que disse que no banheiro dele tinha água quente.
Outra de
banheiro.
Viajamos de VAN para o Malanje pra visitar locações, umas 5 horas de viagem. Aquela estrada reta sem fim muito parecida com as do norte do Brasil, sol escaldante, vegetação rasteira, nenhuma casa, nenhuma cidadela, naaaada, raramente cruzávamos com outro carro. Aí eu morrendo de vontade de fazer xixi falei pro nosso motorista:
- Cassoma quando aparecer um posto para por favor porque eu
preciso ir ao banheiro.
- Ih chefe
Ánna, não tem posto.
- Como
assim não tem posto?
- Agora só
em Malanje
Esperei mais
uns km até não aguentar mais e pedi:
- Cassoma
encosta aí que vou fazer na estrada mesmo.
- Chefe
Ánna não pode fazer isso!
- Eu fico
abaixadinha na lateral da Van, ninguém vai ver!
- Não é
por isso é porque pode pisar numa mina e explodir.
Sabe Deus
onde foi parar a vontade de fazer xixi.
Até hoje tem
minas espalhadas em Angola. O espectro da guerra ainda paira por lá.
Mas estou me
alongando muito, conto outras passagens de lá em outro texto porque agooooooora
vou explicar o título “O mundo é uma Kombi”, ou o mundo é um ovo, ou seja, o
mundo é pequeno.
Voltei ao
Brasil e na mesma semana fui chamada pra fazer uma campanha política em Recife.
Primeiro dia
reunião com criação, chefe do jornalismo, rádio, trilha, coordenação de
produção, quase todos de fora, para nos conhecermos quando a porta abre e entra
o dono da produtora com o diretor que ia dividir a campanha comigo.
-Esse é o
diretor Pablo Polo que é daqui de Recife e vai fazer parte de nossa equipe.
- Pablo
Polo? - Eu disse
desconfiada
– Você
estava em Angola?
Ele olhou
assustado pra mim
- Sim,
como você sabe?
- Porque
eu acabei de voltar de lá, fui pra te substituir e convenhamos que Pablo Polo
diretor só pode existir um.
Vocês ACREDITAM?????????
O mundo
realmente é pequeno e cabe em uma Kombi!
Minhas
histórias com Pablo, outro irmão de alma que encontrei na vida conto em outro
texto.
Dema em frente a Batuque Filmes - Angola
Tenho me divertido com vcs! ❤️🎬
ResponderExcluirQue ótimo!!!! Fico feliz com isso
ResponderExcluirmuito bom!
ResponderExcluirObrigada!!!!!!!!!
ExcluirO que seria da vida sem as aventuras e o
ResponderExcluirpoder de revivê-las em nossas lembranças? Muito legal Ana, um beijo do Wesley M.
Né? Que bom que vc tá acompanhando o blog Wesley, ainda vou contar aquela nossa do Auto Esporte .
Excluirhauhauahuahu. Que delícia ler essa história!!! Fo uma concidência e tanto a gente não ter se encontrado emAngola e poder ter começado a criar nossa propria história juntos na minha cidade. Saudades, irmã! Um xero.
ResponderExcluirDestino meu irmão!!!!!!!
ExcluirCoisas boas devem ser divididas e isso que vocês fazem com maestria, na hora tudo é um "perrengue", mas depois..... quanta diversão....bjs..
ResponderExcluirAinda bem que podemos rir hoje! bju
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